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EXERCÍCIOS - Exercício 60

  • (FUMARC 2018)

TEXTO I:

Nossa Senhora dos Destoantes

Luís Fernando Veríssimo

A pequena Capela de Nossa Senhora do Rosário do Padre Faria é uma das tantas joias arquitetônicas de Ouro Preto. O exterior despojado não prepara o visitante para a opulência barroca do interior. O campanário fica afastado do corpo da igreja, como a “casinha” numa morada sem banheiro, e nada tem de imponente. Os sinos da Capela de Padre Faria badalam em concerto com os outros sinos da região, cantando as horas e os eventos, e não soam nem melhor nem pior do que os outros. Mas os sinos da Capela do Padre Faria têm uma história diferente dos outros.

Quando Tiradentes foi enforcado e esquartejado no Rio de Janeiro todos os outros sinos celebraram a notícia. Afinal, tratava-se da execução de um traidor, de um inimigo da sociedade. Os sinos de Ouro Preto festejaram o castigo exemplar de um réprobo e o triunfo da legalidade sobre a rebeldia. Mesmo que o toque festivo não tivesse sido recomendado pela Coroa, a celebração se justificaria. Mas os sinos da Capela do Padre Faria dobraram Finados. Pela primeira e única vez na história, talvez, os sinos da Capela do Padre Faria destoaram do concerto. Tocaram, sozinhos, uma batida fúnebre pelo martírio de Tiradentes.

Não conheço bem a história e não sei o que motivou as badaladas subversivas. Um pedido de secretos simpatizantes da Inconfidência? Apenas uma manifestação de piedade cristã? Um sineiro bêbado? Não sei. Minha tese preferida é que alguém responsável pelos sinos teve um vislumbre histórico. Teve a presciência que ninguém mais teve e ordenou o toque plangente, em homenagem precoce ao futuro herói e pelo ocaso do poder colonial que seu sacrifício desencadearia.

Nossa Senhora do Rosário serviria como padroeira, não necessariamente de quem consegue adivinhar a História, mas de quem entende o momento que está vivendo ou destoa da maioria, com ou sem razão. Destoantes deveriam ir regularmente em romaria à pequena capela e pedir a bênção dessa Nossa Senhora do Contexto Maior, para melhor poder enfrentar a maioria que badala o que não tem importância e o fato errado e menospreza qualquer batida diferente.

Os outros sineiros de Ouro Preto não tinham como saber que estavam festejando a morte de um herói. Faltava-lhes a perspectiva histórica para entender o momento e só cumpriram o que se esperava deles. Estão perdoados. Mas que nos sirvam de lição.

(Disponível em https://jornalggn.com.br/noticia/nossa-senhora-dos-destoantes-por-luis-fernando-verissimo . Acesso em: 9 fev. 2018)


“É curioso como elas [as crônicas] mantêm o ar despreocupado, de quem está falando de coisas sem maior consequência e, no entanto, não apenas entram fundo no significado dos atos e sentimentos do homem, mas podem levar longe a crítica social”.

CÂNDIDO, Antônio. Para gostar de ler : crônicas. Volume 5. São Paulo: Ática, 2003. pp.89-99.

O trecho em destaque faz parte do texto de Antônio Cândido, A vida ao rés do chão , no qual o autor discorre sobre o gênero crônica. A produção de Luís Fernando Veríssimo ilustra as ideias de Antônio Cândido pelo fato de que




A) alerta quanto à falta de sensibilidade e perspectiva histórica para o entendimento de atos de injustiça do passado e do presente.

B) considera irrelevante culturalmente o toque dos sinos nas cidades históricas de Minas Gerais.

C) denuncia os frequentadores da igreja do Rosário que não se deram conta da importância da sentença dada a Tiradentes.

D) promove, por meio da linguagem descompromissada, a despreocupação quanto a problemas de ordem social e política.

E) valoriza a profundidade dos sentimentos de quem comemorou a sentença sofrida por Tiradentes.


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